sexta-feira, 5 de novembro de 2010

É o creme, Jorge!

Hoje, remexendo em velhas memórias, me lembrei de um costume antigo e há muito esquecido por mim. Inventar doença para faltar à escola. Depois de dezenas de tentativas frustradas, descobri q a melhor maneira era ir à escola e inventar um mal-estar repentino por lá mesmo. Muito mais fácil enganar professoras, diretoras, freiras e porteiros do q enganar mães (especialmente a minha).
 Descolava uma respiração ofegante, uma cara sofrida e me reencostava na parede. Imediatamente era avistada pela professora e levada às pressas à sala da tia Sidônia q me colocava sentada numa daquelas cadeiras com fios de silicone e me arrumava uma colherinha com sal. Eu não fazia idéia pra q servia, mas achava muito interessante e de alguma forma sentia q aquilo era vida q eu tinha pedido a Deus.
 Talvez por isso, ainda hj, tenho uma fixação enorme por essas cadeiras.  Logo q me casei quis q as cadeiras da minha casa fossem uma espécie de releitura daquelas, mas acabei descobrindo q fica muito mais em conta comprar dois bancos enormes q sempre cabem mais um do q 4 cadeiras personalizadas q deixam o resto da família de pé.  Quanto ao sal, somado a cadeira, vai muito bem com uma cervejinha gelada.
Enfim, o fato é q de caso pensado e friamente calculado, eu fazia a pobre da minha mãe se despencar lá do centro da cidade e sair do trabalho no meio do expediente na junta comercial pra me pegar na escola, já completamente esquecida  do teatro de moribunda, com um sorrisinho maroto e a cara mais lavada desse mundo.
É claro q ela já entendia td quando dobrava a esquina e eu me levantava bem depressinha do chão, ansiosa pra entrar no carro e finalmente chegar em casa pra assistir a sessão da tarde na tv. É claro tbm, q ela não deixava barato e a bronca durava o tamanho da viagem da escola pra casa.... ainda bem q não morávamos muito longe.
Por isso rolava certa ansiedade na hora de saber quem ia poder se ausentar do trabalho pra me buscar na escola. Eu ficava na torcida pra q não fosse minha mãe... pq eu sabia q ela ia sacar tudo na primeira olhadela q me desse. Se fosse meu pai tava tranquilo, mas melhor mesmo era que fosse o Jorge. O Jorge era um amigo do meu pai, q quebrava o galho de vez em quando, levando e buscando a mim e ao meu irmão na escola, na natação, ou onde quer q fosse... o cara era gente boa demais. Eu desconfiava q era pq ele morava em Monte Alegre e uma cidade com um nome desses devia ser mesmo habitada só por pessoas legais. Mas a melhor parte não era isso. A melhor parte é q ele ia de caminhão.... nóooooooooooooooo era doido demais.... como eu amava andar de caminhão.
Não sei por anda o Jorge, nunca mais tive notícias dele, me lembro de poucas coisas, mas com muito carinho. Só sei q ele era de  Monte Alegre, trabalhava na retífica com meu pai, dirigia um caminhão, tinha um filho gordinho com quem ele dizia q eu ia me casar, uma barba sempre por fazer, a carinha boa, a risada fácil, e quando chegava de manhã lá em casa, pra nos levar à natação, sempre comentava do cheiro bom da nossa touca e eu dizia: não é da touca, é o creme q a minha mãe passa no nosso cabelo! E ele perguntava: onde compra uma touca cheirosa assim? 

Um comentário:

Maria de Fátima disse...

Ah,Beta! Garota impossível... (até hoje!)bjs, bjs, bjs